Com curadoria de Sofia Dias e Vítor Roriz, o Festival Cumplicidades em colaboração com o MAAT e o Programa Bridges to the Unknown, convida sete artistas das artes performativas (Bibi Dória, Elizabete Francisca, Luís Guerra, Daniel Matos, Leonor Mendes, Bruno Senune e Magnum Soares), para um laboratório de pesquisa e criação artística com a mediação do dramaturgo Alex Cassal. A partir do olhar de cinco neurocientistas (Jaime Arlandis, Beatriz Belbut, Caroline Haimerl, Jorge Ramirez e Tatiana Silva) do Champalimaud Center for the Unknown sobre as exposições de Ana León, Jeff Wall e Rui Moreira patentes atualmente no MAAT, cada participante deste laboratório concebe uma performance a ser apresentada no fim-de-semana de abertura do Festival Cumplicidades, dias 10 e 11 de Maio.
O Laboratório Cumplicidades segue uma metodologia própria que privilegia o trabalho colaborativo, a partilha de práticas de criação e a reflexão acompanhada. É uma oportunidade para artistas testarem desvios aos seus modos habituais de criação e integrarem as perspectivas únicas de cinco neurocientistas sobre o gesto, o movimento, os estados mentais e corporais da criação artística e da performance. É também um momento único para o público assistir a propostas que têm a frescura das primeiras ideias e a força torrencial de 10 dias de intenso trabalho colaborativo.
Curated by Sofia Dias and Vítor Roriz, the Cumplicidades Festival in collaboration with MAAT and the Bridges to the Unknown Program, invites seven performing artists (Bibi Dória, Elizabete Francisca, Luís Guerra, Daniel Matos, Leonor Mendes, Bruno Senune and Magnum Soares) to a research and artistic creation laboratory mediated by playwright Alex Cassal. Based on the perspective of five neuroscientists (Jaime Arlandis, Beatriz Belbut, Caroline Haimerl, Jorge Ramirez and Tatiana Silva) from the Champalimaud Center for the Unknown on the exhibitions by Ana León, Jeff Wall and Rui Moreira currently on display at MAAT, each participant in this laboratory designs a performance to be presented during the opening weekend of the Cumplicidades Festival, on May 10th and 11th. The Cumplicidades Laboratory follows its own methodology that prioritizes collaborative work, the sharing of creative practices and accompanied reflection. It is an opportunity for artists to test deviations from their usual ways of creating and integrate the unique perspectives of five neuroscientists on gesture, movement, mental and bodily states of artistic creation and performance. It is also a unique moment for the public to witness proposals that have the freshness of the first ideas and the torrential force of 10 days of intense collaborative work.
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Em diálogo com a exposição Gestos (2025) de Ana Léon, exposta no MAAT (Lisboa), decidi criar uma performance duracional (01h55m36s) na sala em que se encontra o vídeo Tomber (2014, Ana Léon), onde uma "figura" cai sistematicamente (lembrando-me das palavras de Becket “Try Again, Fail Again, Fail Better” e a sensação de "abismo” que me atrai sistematicamente). A coreografia é um loop de 7 minutos e 21 segundos repetido 16 vezes (feito em 3 loops do vídeo de 2 minutos e 27 segundos de Ana Léon).
A abordagem no meu gesto é feita com intenções internas, intuitivas, não coerentes, criando um dispositivo/atmosfera de camadas sobre camadas, que complexificam o que é visto/sentido, o que eu vejo/sinto. Se o vídeo da Ana Léon examina a queda, num loop becketiano em que o corpo está sempre e outra vez a cair, sem que nunca vejamos o resultado da queda, como se falássemos de um constante acidente num vetor a apontar para baixo, para o solo, para o abismo; na partitura coreográfica falamos do movimento contrário, da tentativa de construção após a queda, ou tentar erguer-se num lugar que está sempre a desfazer-se debaixo de si, atravessado por vetores diversos, desejos, impulsos, remorsos, não havendo uma unidade constante mas uma oscilação que vai da escala da mosca à da baleia. Relaciono também esta oscilação nervosa com o luto. Não o luto como uma pausa, um retiro do mundo dos vivos, mas o luto a estender-se sobre o mundo vivo, dos trabalhos, das demandas. Um luto continuamente a mudar de cara e de sensação. O desaparecimento parece deixar-nos ancorados no passado, na nossa história comum, ou no pico doloroso da cisão, um passado que é como uma fotografia ou uma estátua.
É como se o luto fosse um fungo, que nos entranha e determina tudo que fazemos - mesmo que na aparência estejamos a funcionar normalmente. Um luto que devora o nosso cérebro. É como se a vida, o seu movimento, fosse uma ascidiacea (uma classe de animais marinhos), que passa toda a sua vida em marcha, nadando, até que um dia pára e aí transforma-se, metamorfoseando-se ao digerir o seu próprio cérebro.
Mas como manter-me no passado enquanto o futuro avança ininterruptamente, sempre em movimento, sempre inesperado? Coreogramos a perda? Coreografamos a ausência?
Escrito por Bruno Senune (com partilhas de Alex Cassal)
René Daumal "Um fantasma é de facto um buraco; mas um buraco ao qual se atribuem intenções, uma sensibilidade, uma moral; um buraco, isto é, uma ausência, mas uma ausência de alguém e não de alguma coisa, rodeado de presença, pela presença de um ou de vários. Um fantasma é um ser ausente no meio de seres presentes."
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In dialogue with the exhibition Gestos (2025) by Ana Léon, on display at MAAT (Lisbon), I decided to create a durational performance (01h55m36s) in the exhibition room of Tomber (2014, Ana Léon) video, in which a “figure” systematically falls (remembering Beckett’s words “Try Again, Fail Again, Fail Better” and the feeling of “abyss” that systematically attracts me). The choreography is a 7-minute and 21-second loop repeated 16 times (made in 3 loops of Ana Léon’s 2-minute and 27-second video).
The approach in my gesture is made with internal, intuitive, no coherent intentions, creating a device/atmosphere of layers upon layers, which complicate what is seen/felt, what I see/feel. If Ana Léon’s video examines the fall, in a Beckettian loop in which the body keeps falling over and over again, without us ever seeing the result of the fall, as if we were talking about a constant accident in a vector pointing downwards, towards the ground, towards the abyss; in the choreographic score we talk about the opposite movement, the attempt to build after the fall, or trying to rise up in a place that is always falling apart beneath you, crossed by diverse vectors, desires, impulses, remorse, there being no constant unity but an oscillation that goes from the scale of the fly to that of the whale. I also relate this nervous oscillation to mourning. Not mourning as a pause, a retreat from the world of the living, but mourning extending over the living world, of the work, of the demands. A mourning that comtinually changes its face and feeling. Disappearance seems to leave us anchored in the past, in our common history, or in the painful peak of the split, a past that is like a photograph or a statue.
It is as if grief were a fungus that invades us and determines everything we do - even if we appear to be functioning normally. A grief that devours our brain. It is as if life, its movement, were an ascidiacea (a class of marine animals) that spends its entire life moving, swimming, until one day it stops and transforms itself, metamorphosing itself, digesting its own brain.
But how can I stay in the past while the future advances uninterruptedly, always in motion, always unexpected? Do we choreograph loss? Do we choreograph absence?
Written by Bruno Senune (with sharing by Alex Cassal)
René Daumal "A ghost is in fact a hole; but a hole to which intentions, a sensitivity, a morality are attributed; a hole, that is, an absence, but an absence of someone and not of something, surrounded by presence, by the presence of one or more. A ghost is an absent being in the midst of present beings."
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FALL, FALL AGAIN, FALL BETTER
by Bruno Senune
duration of the performance (1 hour, 55 minutes and 36 seconds)
choreographic score and sound landscape created in dialogue with the video Tomber (2014) by Ana Léon featured in the exhibition Gestos (2025) by Ana Léon at MAAT (Lisbon)
LABORATÓRIO CUMPLICIDADES
created for the Cumplicidades Laboratory event in the context of the Cumplicidades Festival
curated by Sofia Dias and Vítor Roriz
performing arts artists Bibi Dória, Elizabete Francisca, Luís Guerra, Daniel Matos, Leonor Mendes, Bruno Senune and Magnum Soares
neuroscientists from the Champalimaud Foundation Neuroscience Program Jaime Arlandis, Beatriz Belbut, Caroline Haimerl, Jorge Ramirez and Tatiana Silva
mediated by Alex Cassal
installation impermanent Map by Lucas Damiani & Luísa Capalbo
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